A criação do mundo


Mapa de cicatrizes

Aldeia do Mato, hoje Vale Formoso, Covilhã
Mulheres da minha vida: a minha mãe, Maria Manuela, ao colo da minha avó, Leontina, e a tia Livinha, irmã que era como filha da minha avó e teve na minha mãe uma espécie de primeira filha (simples...)

Todos os anos o grande calendário de uma empresa imobiliária, “A Confidente”, era pendurado lá em casa, na cozinha. Só a recordação importa, o nome da firma é irrelevante, como irrisória era a passagem dos dias e dos meses antes de ter consciência deles. Depois, essas marcas do tempo começaram a ganhar nexo, as férias que se aproximavam, sempre tantas, o Natal à vista, uma ou outra prenda que cairia no dia de anos... Muito cedo, porém, o calendário tornou-se aquilo que todos nele vamos construindo, um mapa de cicatrizes, um cíclico lembrete que reabre os lanhos na alma quando os julgamos selados. Não é o caso, sendo hoje dia de uma ferida ainda tão rasgada e funda. Neste teu aniversário, querida Mãe, só poderei beijar-te na memória, como o tenho feito todos os dias e todas as horas desde esse absurdo Novembro, sempre perplexo por ainda bater este meu coração, tão apertado o venho trazendo.

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